Exposição MUBE - 2012

Visitando a casa-atelier de Rubens Zaccharias Jr., duas descobertas surpreendem de imediato: 1) o seu ateliê foi construído de forma a preservar e englobar a casa original. Como um grande recipiente, ele conserva, no seu interior, até mesmo a fachada original da casa, com o seu frontão de tipo zigurate; 2) ele contém uma coleção de livros sobre pintores do passado – e sempre atuais –, que vão desde Masaccio e Piero della Francesca, mestres incontestáveis da prespectiva racional, a Giorgione e Ticiano, mestres da pintura tonal e atmosférica. Neste caso, a surpresa é que Rubens, pintor abstracionista na maior parte do seu percurso, deles fala com entusiasmo.

No percurso criativo que leva Rubens das obras informais de 1995 a 2003 – onde predominam o gesto, a textura das pinceladas e as modulações cromáticas – às recentes “Paisagens Mínimas” de 2010 até hoje – que não se referem a algum lugar existente –,  encontramos as grandes telas com campos e faixas de cores chapadas, onde o gesto parece calar e a geometria toma a dianteira. Nesse processo, vemos algo semelhante à construção do seu ateliê e uma relação com a presença das monografias de pintores figurativos do passado aparentemente antitéticos – os racionais toscanos e os tonais e coloristas venetos.

Não se trata de uma semelhança visual, mas de uma semelhança de processos. A série mais recente das “Paisagens Mínimas”, são, de certa forma, como o ateliê que englobou a casa ou, ainda, como os “atmosféricos” pintores vênetos que incorporaram a estrutura do espaço perspectivado dos “racionais” toscanos. Na faixa horizontal superior do quadro, o modelado, texturas, poucos gestos – justamente “mínimos” – sugerem um céu com a sua profundidade e instabilidade; na faixa inferior, o claro escuro sutil, o gesto menos visível e a cor, via de regra, tendencialmente homogênea – tudo reduzido mais uma vez ao mínimo – sugerem o solo estável ou a superfície de um hipotético mar sempre calmo.

A divisão geométrica do espaço do período anterior permanece, mas em cada um dos campos em que o quadro é dividido, Rubens, agora, englobou as texturas, a gestualidade e as variações tonais do seu passado informal, mas de forma extremamente parcimoniosa – mínima. Esse encontro de estruturação geométrica e tratamento “informe” da cor sugere imagens de paisagens, que poderíamos chamar de “abstratas”, pois não descrevem nem reelaboram uma paisagem real, mas são resultado direto da linguagem pictórica. E essa é uma das qualidades das suas criações: revelar quão fluida é a fronteira entre abstração e figuração (assim como é fluida a separação entre o seu ateliê e a sua casa) e nos lembra, também, de quanta elaboração abstrata há na criação de obras figurativas e, vice-versa, da figuratividade potencial que as obras abstratas trazem consigo.

Aliás, revela-se, assim, quão abstrato é o processo da pintura, independentemente de o resultado ser pura abstração ou uma figura que remete à realidade.  É exatamente para essa duplicidade – ou ambiguidade – que o percurso criativo e a guinada “figurativa” da última série de telas de Rubens Zaccharias Jr. apontam. Se algumas das suas obras mais recentes não estivessem vinculadas ao título da série a que pertencem, teríamos certa dificuldade em ver nelas “paisagens” – ou, pelo menos, ficaríamos suspensos entre dois mundos: o da figuração e o da abstração.

Roberto Carvalho de Magalhães
Critico de Arte e Curador
Professor de Museologia e História da Arte
da Università Internazionale dell’Arte (Florença, Itália)


















fotografias:  Nadja Kouchi






























Fotografia : Abaixo de Dorival


Fotografia: Abaixo de Dorival


Fotografias:  Nadja Kouchi